quinta-feira, 1 de junho de 2017

ANIVERSÁRIO DA ALB NACIONAL




A OPINIÃO DE ROBERT SPAEMANN

 Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal) 

Robert Spaemann é um conhecido filósofo alemão, que nasceu em Berlim, no ano de 1927.
É de parecer, que recordar Auschwitz, é dever de todos, mas não crê, que os jovens aprendam com os erros do passado.
Não crê, porque os intelectuais de esquerda, que criticam – com razão, – as crueldades praticadas pelos nazistas alemães, esquecem – ou será que não conhecem a História!? – os crimes de Estaline…
Spaemann, considera que se fala demasiado do “ Terceiro Império”, mormente na escola. “Isso provoca, em muitos jovens, um reflexo de aversão. Eles perguntam-se: que temos nós a ver com isso? E essa reação pode ir tão longe, que eles acabem por negar Auschwitz e se sintam atraídos pelos radicalismos de direita.”
Na entrevista que concedeu ao semanário “Der Spiegel”, a 20 de Novembro de 1995, conta: que a maioria dos alemães, do tempo do Hitler, conheciam o que se passava, mas não se incomodavam grandemente.
Narra, que certa ocasião, tinha 14 anos, entrou num autocarro, onde seguia um judeu, com a estrela ao peito.
Um jovem nazi, virou-se para ele e disse-lhe para se levantar e dar-lhe o lugar.
Obedeceu prontamente. Spaemann sentiu obrigação de oferecer o seu, ao judeu. Mas receou…Teve medo.
Ficou tão revoltado com o comportamento, que só pensava em derrotar regime tão cruel.
Mas – em sua opinião, – ninguém se incomodava com as barbaridades praticadas pelo regime: “ Quase ninguém queria saber a sério…Agora, todos falam…”
Assevera que os soldados, que regressavam da frente, sabiam dos crimes que se cometiam: “ Podiam saber, se quisessem”.
Preferiam: “ ir na onda”…
Hoje, (1995), segundo Robert Spaemann, não é muito diferente: adaptam-se, sujeitam-se aos regimes vigentes.
Abro parênteses para acrescentar – a opinião é minha, –: a maioria dos cidadãos acomoda-se às circunstâncias: são de direita ou de esquerda, consoante os interesses. Mudam de ideologia, (até de religião!) de harmonia com as vantagens pessoais.
Há honrosas exceções. Há quem seja vertical, mesmo em situações adversas, mas são muito poucos.

A maioria, são como disse o filósofo, referindo-se aos alemães contemporâneos de Hitler: “ Quase ninguém queria saber a sério”…

FAMILY PLANNING

By Arjun Singh Bhati (Jaisalmer, India)

It was ten o’clock in the morning. Students playing outside the school boundary heard the familiar sound of “tan…tan…tan.…”  A boy was hitting a small iron rod on an iron angel hanging on the branch of a dry tree in the school campus.  All the students came in, left their bags in their classrooms, and rushed behind the building into the shadow of the building for prayers. All the students were in lines now; they folded their hands and prayed. It was a primary school.  A headmaster and his three assistants took the attendance register and went into the classrooms.
The headmaster went into the eighth class. He asked his students to open the social science textbook. “Well, we will read lesson seventeen today. It is about population.”He asked one of the students to read the lesson. “Listen to him carefully. I will ask someone to continue reading from where he finishes.”
The student read the first paragraph of the lesson out loud. The headmaster then asked the next one to keep reading, continuing from the next paragraph. All the students heard the lesson carefully read by their classmates.
“Well, now I will ask you some questions. Keep your books in your bags.” He asked, “What are the main causes of population growth?” Some of the students raised their hands while others looked down. He asked a student sitting in the front row. The student replied in mixed language, half Hindi and half local dialect. But he answered the question even in broken sentences. The teacher looked quite impressed with his answer.
“Well, my next question is: What are the ways to check population?” This time he asked a boy who was sitting in the back row. The boy did not know the answer, but just to try his luck, he raised his hand. He was sure that the teacher would not ask him. But he was caught. The boy stood up and could not reply.
The teacher got angry with him. “Come here, you idiot,” he roared. “Why did you not listen when the boy was reading the lesson? You are very careless. Where is your father? Call him tomorrow; I will complain to him. Now get out of here, you idiot.” The boy had just turned back to leave the class, when suddenly a Bollywood ringtone rang somewhere. It was a cell phone in the headmaster’s pocket.
He took the phone out and replied, “Hello, hello.” But the network failed, and he could not hear anything. Within a few seconds, the phone rang again, and this time to hear clearly, he switched on the cell-phone speaker. A lady’s voice sounded from the phone.
“Hello, hello. Yes, I can hear you,” the headmaster replied this time.
 “Congratulations on the birth of your son.” The headmaster smiled, and the students laughed.
 “Shut up,” he cried and left the classroom. The students laughed loudly again. They knew the headmaster’s family well.
Just three months previously, his family was living here near the school building. He had eight children: four daughters and four sons, and now with the latest news, he was the father of nine kids.

The boy who could not answer asked the students, “What are the ways to check the population?” and one of the students replied, “Our headmaster knows better!”

AJEDREZ

Por Jorge Luiz Borges (Buenos Aires, 1899 – Genebra, 1986)

                            I

En su grave rincón, los jugadores
rigen las lentas piezas. El tablero
los demora hasta el alba en su severo
ámbito en que se odian dos colores.

Adentro irradian mágicos rigores
las formas: torre homérica, ligero
caballo, armada reina, rey postrero,
oblicuo alfil y peones agresores.

Cuando los jugadores se hayan ido,
cuando el tiempo los haya consumido,
ciertamente no habrá cesado el rito.

En el Oriente se encendió esta guerra
cuyo anfiteatro es hoy toda la tierra.
Como el otro, este juego es infinito.

                            II

Tenue rey, sesgo alfil, encarnizada
reina, torre directa y peón ladino
sobre lo negro y blanco del camino
buscan y libran su batalla armada.

No saben que la mano señalada
del jugador gobierna su destino,
no saben que un rigor adamantino
sujeta su albedrío y su jornada.

También el jugador es prisionero
(la sentencia es de Omar) de otro tablero
de negras noches y de blancos días.

Dios mueve al jugador, y éste, la pieza.
¿Qué Dios detrás de Dios la trama empieza
de polvo y tiempo y sueño y agonías?


(1960)

ICONOCLASTA

Por Samuel da Costa (Itajaí,SC)

Foi de repente...
Depois de muito tempo,
Ela decidiu voltar para casa...
Sem qualquer explicação aparente
Sem dizer uma palavra sequer...
Sem dar motivos para sua partida
Ou mesmo do seu retorno...
E eu afinal de contas
Sem dizer nada
Uma palavra ao menos...
Sem saber o que fazer
Acabei aceitando-a de volta
Como se eu não fosse nada
Uma mera figura decorativa
Bem ali parada
Disponível
Dispensável & artificial
Contudo
Já não poderia viver sem sua doce presença
Na minha vida...
Tão inconstante & breve
Não tinha como não aceitar
As coisas são assim inexplicáveis...
Inconstantes
Irreais
Surreais...

A INFLUÊNCIA DA CASA PATERNA

 Por Humberto Pinho da Silva (Porto, Portugal)
  
Disse o grande pedagogo Ribeiro Sanches, na “ Cartas Sobre Educação da Mocidade”, que: “ O povo não faz boas nem más ações, que por costume e por imitação.”
E disse bem: somos o que somos porque vivemos em determinada época, influenciados pelo que ouvimos e vemos; movidos pelas atitudes e comportamentos, que presenciamos ao longo da vida, mormente na infância.
Em “ Psychologie de l’Opinion et de la propagande politique” – Paris, 1927 – Jules Rassak, confirma o que assevero: “ As impressões recebidas na casa paterna, a recordação da sua maneira de viver, das suas opiniões e dos seus atos, subsistem no subconsciente e exercem influência sobre o estado consciente.
“ Mesmo as pequenas impressões sentidas, os acontecimentos insignificantes, as peças de teatro, as leituras etc., não são esquecidas, persistem no subsolo da nossa alma, e influenciam a nossa vontade e o nosso pensamento.”
Essa influência, é – apesar dos malefícios da globalização, – notória, se compararmos a sensibilidade de vários povos. É essa influência, que faz, que povos, que vivem em territórios ricos, vegetem numa quase miséria, enquanto outros, que habitam em terras pobres, prosperem.
Recordo, que, quando o ciclismo estava na berra, e os operários deslocavam-se de bicicleta – em meados dos anos cinquenta, – ver pelotões de trabalhadores, subirem a avenida da minha terra, em competição. Todos queriam ser: Camisola Amarela!
E o mesmo acontece com a “ vocação” de muitos adolescentes, durante o Campeonato Mundial de Futebol. Todos desejam ser jogadores!
Basta dizerem que está na moda: o ioiô, e todas as crianças querem ter um. Recordo a coqueluche do hola-hupe, do cubo mágico, da pulseira magnética…e presentemente do pokémon go.
Dizem: estar na moda, e isso basta para que todos comprem; para que todos usem.
Até na literatura, e na música o “fenómeno” acontece!
O livro é vendido, não pelo valor da obra ou utilidade; mas, devido à eficiente propaganda; e o mesmo sucede à música.
Concluindo: se temos a sociedade que temos, é devido à educação que transmitimos aos filhos; às escolas que temos; e a conceitos que inculcamos às crianças, desde o berço.
Como queremos sociedade mais justa, se todos – ou quase todos, – damos o mau exemplo de obter tudo com o “ jeitinho”; se corrompemos, o semelhante, com dinheiro; e as nossas condutas são deploráveis!

Os jovens, são, em regra, a educação que recebem, como disse Rassak. “ As impressões recebidas na casa paterna…influenciam a nossa vontade e o nosso pensamento.”

PROZAC PEOPLE

 Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

Eu não sou
Como as outras pessoas!
Eu prefiro enlouquecer
Em horas marcadas.
Em datas pré-agendados...
Para evitar certos olhares tortos,
Comentários maldosos & certos constrangimentos!
***
Eu prefiro enlouquecer em dias...
Previamente marcados!
E em horas remotas.
E em dias remotos.
Sem que ninguém perceba...
***
Eu prefiro enlouquecer aos poucos...
De forma bem lenta!
E completamente sozinho...

CONCRETO

Por Pedro Du Bois ( Balneário Camboriú, SC)



Onde desperto

concreta base

inutiliza a vista

do que avisto



paredes

vidros

janelas



concretada paisagem

em altos prédios

onde escondemos

os corpos



fosse ruim a terra bruta

conservada no frescor

do tempo em contato



concretizados

nos recolhemos

em janelas fechadas.


CONCRETE

By Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)
(Marina Du Bois, English version)

Where I wake up
a concrete base
disables the view
of my sight

walls
glasses
windows

concreted landscape
in high buildings
where we hide
the bodies

as if it was bad a gross land
preserved in the freshness
of the time in contact

concretized
we gather

in closed windows.

REVER

Por Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)
Revejo
como colocadas as coisas
entre mesas com pessoas
buscando em garfadas
enfrentar seus pensamentos
rever
    ajuda?
rever
    prejudica?
rever: como não ser

visto novamente.

AMOR PROFUNDO

Por Vivaldo Terres (Itajaí,SC)

Quisera que compreendestes,
O sofrimento meu.
Sozinho e amargurado.
Portanto te amar
Me dá uma esperança...
Uma esperança, e não uma ilusão.
Pois és tu, o grande trunfo,
Que ainda me falta conquistar.
***
No mundo não mais pretendo.
Lutar por outras coisas,
Pois tudo, consegui sem muito esforço.
Hoje o meu objetivo maior é que me ames,
Somente assim acabara de vez
O meu desgosto.
***
E juntos seguiremos na vida,
Cheios de paz e amor profundo.
E o nosso amor será bendito,
E o mais abençoado em todo mundo.


WILL

By Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)

(Marina Du Bois, English Version)

So many times I left
                          forever
as stop smoking
                 nevermore
or telling the first
lie of the day

always shows up to be close
and the turn of
                 is quick
as going back to smoke
or telling the first lie
               of the day

tomorrow I will be gone
                               forever

and I will take the cigarettes.

VONTADES

Por Pedro Du Bois (Balneário Camboriú, SC)

Tantas vezes fui embora
                      para sempre
como parar de fumar
                      nunca mais
ou dizer a primeira
mentira do dia

o sempre se mostra perto
e o retorno se faz
                         rápido
como voltar a fumar
ou dizer a primeira mentira
                          do dia

amanhã irei embora
                     para sempre

e levarei os cigarros.


EM VIOLETAS PAIXÕES

Por Samuel da Costa (Itajaí, SC)

Para Izabella Silva

Não! Não quero mais ser sua
Não quero mais
Os teus ternos carinhos
Nem tão pouco os beijos teus
***
Não! Eu não vou ficar
Mais ao lado teu
E quando eu sair pela porta afora
Não me peça para voltar
***
Não me procures mais
Nunca mais
Nem fiques de joelhos
Implorando o meu amor
Para que volte
Para a nossa solidão a dois
***
Não! Não me traga inexatas flores
Não! Não me peça perdão
Em violetas paixões
***
Não! Não acredito mais
No teu amor

VIOLÊNCIA É REAL

Por Samuel da Costa (Itajaí,SC)

Ela decidiu morrer...
Ela tinha somente 16 anos
Quando decidiu morrer...
E ninguém percebeu nada...
Pegou a arma que pertencia ao seu pai
Uma arma devidamente legalizada
Aquele objeto reluzente
Ajudou ela a morrer...
De uma forma tão estúpida

O ABRAÇO

Por Clarisse da Costa (Biguaçu, SC)

                                                           Ao Edson Araujo
No braço
o abraço
o laço
que faço
desfaço
e refaço;
Hoje, o abraço
é o laço
que dou
te amarrando ao coração!

NOITE DE INVERNO

Por Vivaldo Terres (Itajaí, SC)

Era noite de inverno o vento rugia,
A noite era longa e o frio também.
Minhalma coitada de tanto sofrer...
Chorava e gemia com saudade de alguém.
***
Esse alguém que no passado...
Estava ao meu lado e sorria feliz,
E dizia me amar, foi embora sem deixar um adeus...
Desapareceu para nunca mais voltar.
***
E o tempo passou rápido e veloz,
Meus cabelos escarneceram.
E as rugas em meu rosto mostram isto também.
Que envelheci por dentro e por fora,
Mais o que mais me devora...
È a saudade daquela que eu sempre amei.

DE PRÍNCIPE A LORDE DAS LETRAS

Por Clarisse da Costa (Biguaçu,SC)

            Quem diria entre nós mortais um Príncipe Negro? Isso por volta do século XX, logo bem no início, em Porto Alegre na região de São Batista de Ajudá. São João Batista de Ajudá era uma fortaleza portuguesa no Daomé, esta fora muito povoada por negros cristãos. Construída por ordem do Rei Dom Pedro II com a intenção de proteger o importante e forte comércio que até então os portugueses faziam. Isso tudo na Costa de Mina. Bem orquestrado, pois o seu território era à beira mar do oceano Atlântico. Exatamente no golfo da Guiné. Daomé foi colônia de diversos países. Mas vamos ao que interessa. No entanto preciso relatar um pequeno detalhe, talvez fundamental para se chegar ao fato importante da história. Como havia dito, Daomé foi colônia de diversos países, porém por pouco tempo. A Grã-Bretanha comprou a parte de outros ocupantes, o que fez de Daomé propriedade inglesa. E os portugueses, considerados poderosos se contentaram com uma parte pequena da Guiné e com as Ilhas de São Tomé e Príncipe, assim cedendo suas fortalezas.
            E você me pergunta: - Onde está o Príncipe Negro nessa história? Já lhes digo. Antes da compra de Daomé, teve a invasão inglesa ao reino de Daomé, hoje atual Benin, no início do século XX. Assim surgiu o Príncipe chamado Osanielê do Sapatá Erupê. Este, para evitar o derramamento de sangue do seu povo propôs um acordo com aquela temida coroa inglesa, de simplesmente exilar-se. Mas para isso, como uma troca, a coroa britânica manteria sua família e toda sua corte no exílio. Para isso acontecer de fato o príncipe teria que escolher um lugar para onde ficar. E não deu outra, o príncipe escolheu o Brasil, em especial o estado do Rio Grande Sul. Assim levando uma vida social bem intensa, teve uma representação importante na política e religião. Agora na atualidade o negro deixou de ser príncipe pra ser o Lorde das letras. O que é difícil, pois ocupar espaço na literatura brasileira especificamente catarinense é nada fácil, ainda mais sendo negro quiçá negro e pobre.

            Mas diante de um grande número de pessoas brancas o negro, por mérito de seu esforço e trabalho, subiu mais um degrau da sua luta perante a sociedade e conquistou o título de imortal na Academia de Letras do Brasil – Seccional de Itajaí. Na representatividade de Samuel da Costa e Hang Ferrero, eis que surgiu na tarde de sábado do dia 22 de outubro de 2016, os ‘’Lordes das Letras’’. Lordes? Por que não? Chegar onde eles estão não é fácil para qualquer um. A literatura requer muito trabalho, dedicação e conhecimento. E ambos mostram que o negro é capaz de muito mais que a mente humana cria. A mente humana, mal informada e educada criou o escravo, criou toda mística do ser anormal e normal. Criou o mundo todo branco e machista, onde o negro não passa de um mero coadjuvante e a mulher um objeto sexual. O negro no Sul calou a voz dos conservadores, agora abusa da sua catimba e se afirma no mundo.

ALÉM DO NORTE, LÁ TAMBÉM É O ESCRÍNIO DA MAIS PRECIOSA JOIA

Por   Urda Alice Klueger (Enseada de Brito, SC)

                            (Para E. V. S. F.)
          
                        Por acaso, aqui na internet, passei por uma foto que me fez parar e olhar com mais atenção. Ampliei-a. Dei a primeira olhada.
                                   Era da cidade que já foi minha, vista bonita, Beira Rio, provavelmente tirada do Morro da Antena, e a olhei com curiosidade, pois por tanto tempo aquela cidade foi minha que deveria me despertar alguma reação.
                                   E a reação veio, mas nada dizia do lugar aonde nasci à Rua XV de Novembro 1398, nem da minha infância na Garcia, nem das escolas que frequentei, nem dos empregos que tive, nem dos lugares onde morei, nem das pessoas que conheci – por um momento foi uma foto estática, que nada dizia além da localização geográfica e do ângulo em que foi tirada, até que, com a força de um vulcão em erupção, irrompeu das minhas entranhas, do meu coração, do meu âmago, das mais vivas e fortes fibras do meu ser, da minha essência mais profunda o que aquela cidade representava para mim, e que era a intensidade do amor, e o nome do amor afluiu à minha boca e ao meu coração com a intensidade de sempre, e eu me curvei de dor a repetir aquele nome, e me curvei de dor porque nada mudou, tantas décadas depois, e aquela cidade, e aquela Beira Rio que ainda não existia, e aquele rio simbolizam o mesmo amor que um dia simbolizaram e deram o sentido da minha vida, mesmo quando a espada do Destino veio e cortou abruptamente aquela maravilha que se vivia. Encurvada pela dor, olhava para aquela foto e ouvia, como que rimbombando poderosamente em todo o meu entorno aquele nome que eu pronunciava como a palavra cabalística que é e que faz toda a diferença em eu estar viva ou não estar, e esse estar viva ou não estar é o que acontece nesta vida e que deverá acontecer em outras.
                                   Então, agora sei o que aquela cidade representa, e lá de ela, através da foto ocasional, o amor estava e veio em ondas coloridas e chegou até mim, e só então eu entendi a cidade, o porquê da cidade, qual o meu laço com ela. Como que ancorada lá, está a mais linda história de amor que alguém já viveu e agora eu posso ir-me e ser feliz porque a história está comigo como meu bem mais precioso, e se algum dia tiver alguma dúvida, saberei onde está o escrínio que guarda aquela joia mais preciosa de todas, pois está comigo mas tem as raízes lá.
                                   Chorei de tanto amor por todo o tempo em que escrevi este texto.


                                   Enseada de Brito, 05 de maio de 2017, dia diáfano de tão azul clarinho.


LEMBRANDO DA ESTRADA DE FERRO

Por   Urda Alice Klueger (Enseada de Brito, SC)

(Escrita em 1995 – com novas informações sobre o que aconteceu a seguir incluídas no ano de 2017)

 Como num bom filme de Western, tínhamos uma estrada-de-ferro aqui no Vale do Itajaí, desde o começo do século até 1966 ou 1967, não tenho certeza. Ela ligava Blumenau até quase os confins da região colonizada um século antes; ligava Blumenau ao porto de Itajaí. Era uma estrada importante: a vida da região corria por ela. Para tudo nos servia, e, além do seu papel econômico, era uma fonte de alegrias, era a promessa das coisas boas.
Vou contar um pouquinho da minha experiência com ela. Na minha infância, a estrada-de-ferro significava encantadores finais-de-semana na casa da minha avó, em Lontras. A gente tomava o trem no centro de Blumenau, e o meu delírio nessas viagens era comer cocada, que meu pai sempre acabava comprando do vendedor do trem, iguaria rara, a mais deliciosa que eu conhecia. Podia acontecer, inclusive, que numa viagem de trem a gente experimentasse até um sonho recheado de mussi com guaraná (a Coca-Cola ainda não chegara por aqui), e aquilo dava o colorido maior das minhas viagens de infância. Eram muitas horas no trem, creio que umas sete ou oito, atravessando túneis cheios de fagulhas e vendo paisagens ousadas e maravilhosas, até chegarmos a Lontras e à casa do meu avô.
Estar lá era uma festa! Havia sempre grandes bacias de vidro cheias de sobremesas de ameixa ou de pêras, mas, acima de tudo, havia o convívio e as brincadeiras com meus primos Lori, Ralph, Rudy e Fred. Brincávamos como loucos o dia inteiro, e voltávamos no domingo à tarde, sempre carregando sacos cheios de tangerinas, pêras ou Pflaumenn, ou as deliciosas limas, tão fora de moda atualmente, quase sumidas do mercado. Dormíamos de cansaço nos bancos duros do trem, e, chegando em Blumenau, pegávamos um carro-de-mola na estação (antepassado do táxi, puxado a cavalo), pois eram muitas as frutas e as crianças cansadas a carregar.
Creio que a viagem mais chocante que fiz na antiga estrada-de-ferro foi quando tinha 14 anos, portanto, em 1966, às vésperas do trem ser desativado. Fui com meu pai, visitar minha avó (meu avô já tinha morrido fazia tempo). Eu era uma autêntica adolescente/aborrecente, e lembro-me muito bem como me vesti para a viagem de trem: moderna saia plissada de nycron branco, moderna blusa de ráfia vermelha brilhante, moderníssima touca de ráfia branca que herdara da minha irmã, e que, lembrando agora, tenho a certeza de que parecia um porco-espinho. Moderníssima, entrei com meu pai no velho trem, ansiando, como toda adolescente que se preza, pelas grandes aventuras que viriam. E a aventura estava lá, no mesmo vagão, na forma de um rapaz lindíssimo, claro, bem vestido, que, na mesma hora, me concedeu a honra de me olhar com admiração. Era um cara já bem velho (calculo que tivesse seus 20, 22 anos), e foi uma loucura a paquera que rolou, a gente a se olhar a viagem inteira quando meu pai estava distraído, eu me sentindo a própria Mata-Hari com aquela touca de ráfia que mais parecia um porco-espinho. Naquela minha derradeira viagem de trem no Vale do Itajaí, nada vi da paisagem: todos os momentos foram dedicados ao “gato” que me paquerava também. Ele saltou antes de mim, creio que na estação de Subida ou ali por perto, e eu segui com meu pai para o final-de-semana na casa da minha avó.
Houve bacias de vidro cheias de sobremesa de ameixa e galinha ensopada com bolinhos de arroz, como sempre, na casa dela, e meus primos já estavam muito grandes para que quiséssemos brincar como antes. Gastei o tempo lendo velhíssimas Seleções do Readers Digest, e chegou a hora de voltar.
Quem entrou no trem, provavelmente de novo na estação de Subida? O “gato”, nem mais, nem menos. Desfalescente de emoção, a adolescente/aborrecente não queria acreditar em tamanha sorte. E a paquera rolou de novo.
No meio do caminho, aproveitando que meu pai fora tomar água (Ai! Que luxo eram aqueles bebedouros do trem, com suas piazinhas brancas!), o moço gato, gatíssimo, levantou-se e veio até o meu lugar. Sem fôlego para responder, peguei na mão o cartão de visitas que ele me dava (que luxo!), e o ouvi dizer:
- Escreva para mim neste endereço! – (telefone, naquela época, nem pensar.)
Escondi o cartão no sutiã antes que meu pai voltasse, e passei dias, semanas, com ele queimando na mão. O nome do moço era Otávio Hiandts, e ele era de Itajaí. Escrever-lhe era a minha maior vontade, mas se ele respondesse? Como justificar em casa estar recebendo carta de um desconhecido? Foram dias de dura luta interior, até pegar minha caneta Parker e um papel bem bonito, e lhe mandar uma carta:
“Não quero que me escrevas, porque meus pais podem não gostar.”- mais ou menos assim, coisa bem boba, dessas que a gente faz na adolescência.
Num mais soube nadinha do príncipe Otávio Hiandts, de Itajaí, que, provavelmente, como eu, tinha uma avó com quem passar o final-de-semana pelas beiradas da linha do trem. Hoje ele dever ser respeitável senhor, avô de netos, talvez barrigudo, talvez careca, e as pessoas de certo nem se lembram o quanto já foi bonito. De repente, com esta crônica, até alguém me dê notícias dele.
Mas que pena que o trem acabou! 

Blumenau, 24 de Setembro de 1995.

ADENDO:

Depois da publicação desta crônica no Jornal “A Notícia”, de Joinville, que circulava por quase todo o Vale do Itajaí, eu fiquei esperando alguma notícia de Otávio Hiandts. Em seguida, ela saiu numa revista e depois no meu livro “No tempo da bolacha Maria”, livro que até hoje circula amplamente, e nunca apareceu de novo aquele rapaz. Dezenas, com certeza mais de centena de alunos, nas mais diversas escolas, assim como muitos leitores, perguntaram-me por ele – e eu não tinha resposta.
Quando veio a Internet e toda a gente passou a ter seu e-mail e poder acessar sítios de busca que eram os antepassados do Google, como o Cadê e o Alta Vista, por exemplo, um dia cheguei em casa, e ao abrir os e-mails, vi que alguém me escrevera com o sobrenome Hiandst. Tratava-se do filho daquele moço bonito que, penso, num momento de diletantismo, colocou o nome do seu pai nos sítios de busca – e ele apareceu na minha crônica! Esse gentil moço fez contato comigo e hoje somos amigos no face-book. Contou-me que, infelizmente, seu pai falecera prematuramente. Naquela altura, a única referência que ele encontrou sobre seu pai na Internet... foi a minha crônica! Fiquei muitíssimo emocionada.
                                           
                                 Enseada de Brito, SC, 17 de maio de 2017.