sábado, 1 de agosto de 2015

CORDEL PARA MANOEL DE BARROS

Por Gustavo Dourado (Taguatinga, DF)

Beco da Marinha, Cuiabá
O local de nascimento
Ruelas, garimpos, águas
Dimensidão do firmamento
Bichos, pedras e lagartos
Natureza em movimento

1916:
19 de dezembro
Nascimento de Manoel
Do poeta que relembro
Em 2014 faleceu
Dia 13 de novembro

Poeta mato-grossense
Por natureza cuiabano
Foi viver em Corumbá
Com a idade de um ano
Campo Grande, tempo menino
Recebe o poeta-arcano

Venda, fazenda de gado
Bois, cavalos, humanimais
Garças, rãs, aves e flores
Árvores monumentais
Garças, antas, capivaras
Onças e os marruais

Manoel de Barros no mato
Nos currais com os pés no chão
Pisava em bosta de boi
Nequinho em evolução 
Lia os livros da terra
Água em evaporação

Manuel Wenceslau Leite de Barros
Barro e leite em formação
Cuiabá, Corumbá, Campo Grande
Terreiros de iniciação
Rio de Janeiro no caminho
Leitura e informação

Estudou em Campo Grande
10 anos no internato
Temperamento rebelde
Um crítico intimorato
Contra os Sermões de Vieira
Fez um protesto de fato

Disciplina do internato
Na escrita a rebeldia
Clássicos da literatura
Os mestres da poesia
Pintura, arte, cinema
Despertam a filosofia

Início como prosador
Desde os 13 escreveu
Aos 19 anos de idade
Na poesia se inscreveu
Tece o primeiro poema
Prosa e verso empreendeu

Com leituras de Rimbaud
Foi bem influenciado
Na juventude comunista
Militante de alto brado
Pichou “Viva o Comunismo”
Em monumento do estado

“Nossa Senhora de Minha Escuridão”
Manuscrito elaborado
Levado por policiais
O texto foi censurado
O livro de Manoel
Pelo poder expropriado

“Poemas concebidos sem pecado”
Um livro artesanal
Primeiro livro editado
Na capital federal
No Rio de Janeiro
O começo literal

1937:
Primeira publicação
Apenas 20 exemplares
Em uma única edição
Patrocinado por amigos
Teve boa aceitação

Olga Benário foi presa
Pelo regime getulista
Manoel de Barros criticou
O ato do comunista
Prestes apoiou Vargas
Ação que não foi bem vista

Poeta questionador
Manifesta o menestrel
Critica Getúlio Vargas
Por atitude cruel
A aliança com Hitler
Foi amargo como fel

1941:
O ano da formatura
Fez o curso de Direito
Apreço à literatura
Depois foi pro Pantanal
Cuidar de sua escritura

Antônio Vieira e Rimbaud
Marx e o comunismo
Crítica ao Partidão
À infâmia do nazismo
Perseguido por Getúlio
Vítima do stalinismo

Manoel perdeu o rumo
Ficou decepcionado
Abandona a militância
Percebeu um outro lado
Na Bolívia e no Peru
Novo tempo, outro brado

Viagem para Nova Iorque
Residente por um ano
No Museu de Arte Moderna
A arte em primeiro plano
Estudou pintura e cinema 
Pulsou o poeta arcano

Retornou a Mato Grosso
Adentrou-se ao Pantanal
Fixa-se em Campo Grande
Cria gado ao natural
Fazendeiro da poesia
Poeta fenomenal

1942:
"A Face Imóvel" publicou
O pantanal como tema
No abstrato se inspirou
Olho, tato, ouvido, cheiro
O seu jeito impregnou

Do casamento com Stella:
Os filhos Pedro, Marta e João
Do seu “Livro das pré-coisas”
Marta fez ilustração
Bela arte para a capa
Da segunda edição

Já nos anos sessenta
Alguns prêmios conquistou
Desconhecido do público
Por um bom tempo ficou
Aos poucos foi descoberto
Seu nome se projetou

Millôr Fernandes divulga
De Manuel a poesia
Idos dos anos 80
Novo tempo se anuncia
Conquista alguns prêmios
Ao sucesso prenuncia

“O Guardador de Rebanhos”
Torna-se livro premiado
Recebe um “Jabuti”
Um prêmio bem destacado
Manoel tem seu trabalho
Pela imprensa divulgado

Macunaíma, Mário de Andrade
Uma grande influência
Vanguardismo europeu
Na verve da consciência
Oralidade brasileira
Na arte da confluência

Destacado por Houaiss
Por Drummond reconhecido
A natureza e o cosmos
Inspiram o seu sentido
Neologismo e invenção
Em seu verso atrevido

Poeta pós-modernista
Expressa o primitivismo
Leitura de Mário e Oswald
Os líderes do modernismo
Natureza em sua arte
Para além do paisagismo

Manoel da natureza
Poeta da humildade
São Francisco no olhar
Arte e naturalidade
O cosmo e a linguagem
Em sua vivacidade

Presença do onirismo
Sintaxe da oralitura
Pluralidade coloquial
Em versos que é pintura
Oralidade marcante
Sob o léxico da natura

Reconfiguração do ser
O pensame manoelino
Desracionaliza a gente
Nos ressurge o silibrino
Desautomatiza o olhar
Faz da noite um matutino

Palavras em formação
Brota o neologismo
Aproxima a natureza
Com o nosso humanismo
Vanguardista primitivo
Vai do pântano ao abismo

Supera as dicotomias
Foge do artificial
Pulga, sapo, peixe, cobra
A paisagem natural
O ser humano sem nós
Aguar, céus, luz, vegetal

A expressão do ambíguo
Vida em instabilidade
Estilística do simples
Viva multiplicidade
Multiversa a poesia
Pulsa universalidade

Compêndio para uso dos Pássaros
Gramática expositiva do chão
“Matéria de Poesia”, “Arranjos para assobio”
“Poesias” de alta elaboração
Livro de pré-coisas e outros mais
Manoel em profusão

“Concerto a céu aberto para solo de aves”
“Poesia quase toda”, “Livro sobre Nada”
“Para encontrar o azul eu uso pássaros”
“O fazedor do amanhecer”, luz-madrugada
“O livro das ignorãcas”, “Poemas Rupestres”
“Exercícios de ser criança”, a bela jornada

“Das Buch der Unwissenheiten”
“Riba del dessemblat”, antologia
Memórias inventadas I, II, III e IV
“Águas” que umedecem a poesia
"Tratado geral das grandezas do ínfimo"
A natura foi sua tecnologia

“Encantador de Palavras”, “Menino do Mato”
“Ensaios fotográficos”, “Poesia completa”
“Todo lo que no invento es falso”
Manoel nos faz a festa
“Cantigas para um passarinho à toa”
O canto da natureza nos desperta

“Memórias inventadas para crianças”
“Poeminhas pescados numa fala de João”
“Meu quintal é maior que o mundo”
Nossa infância marca o coração
“Poeminha em língua de brincar”
É vida em transmutação

“Escritos em verbal de ave”, “A Turma”
Livros infantis em coleção
“As infâncias de Manoel de Barros”
Criança em manifestação
Primeira/Segunda/Terceira infância
Ser criança é ser canção

Portal de Pedro Viana e outros livros
Poesia, prosa, infanto-juvenil
Seletas, antologias poéticas
De um coração varonil
Narrativas antropológicas
E o amor pelo Brasil

Apreciava a pintura
Miró, Picasso, Chagall
A Serra do Roncador
Natureza no quintal
Chapada dos Guimarães
As águas do Pantanal

No caminho das origens
Sentimento de aldeia
Criançagem em palavreio
Primitivivo na teia
Índios, rios, árvorestrelas
Rios que escorrem na veia

Muitos prêmios conquistou
Dois Jabutis de poesia
Ganhou dois prêmios Nestlé
De alta categoria
Biblioteca Nacional e Minc
Méritos à fantasia

“Gramática Expositiva do Chão”
Prêmio da Fundação Cultural
Reconhecimento da obra
No Distrito Federal
Na cidade de Brasília
Um momento fulgural

Prêmio Jacaré de Prata
Melhor escritor do ano
Em 1990:
Um poeta soberano
Em Mato Grosso do Sul
Manoel em alto plano

Prêmio Orlando Dantas – Diário de Notícias
Prêmio Nacional de Poesia
Prêmio Alfonso Guimarães
Obra de carpintaria
Prêmio Nacional de Literatura
Ao bom talento se premia

Prêmio dos Críticos de Arte - APCA
ABL - Prêmio da Academia
Manuel é referência
Em matéria de poesia
Artesão da escritura
Poeta luz da alquimia

Fellini, Kurosawa, Buñuel
Os poetas da imagem
Gostava de Jim Jarmusch
De pessoa em “Mensagem”
Glauber e Guimarães Rosa
Viajantes da linguagem

Em Klee, Braque e Van Gogh
O sentido da liberdade
Lia a Bíblia e dicionários
Gostava da pluralidade
Encantava-se com Chaplin
Sem a linearidade

O escritor João Antônio
Em Manoel viu estampido
Para Millôr, apogeu do chão
Por Houaiss ele foi lido
Para Rosa, um “doce de coco”
Das águas flui seu bramido

O cheiro do sol no arco-íris
Lagartixa e sapoal
Lesmas, rãs e caramujos
Mistério do vegetal
As formigas, as aranhas
Os jacarés do Pantanal

Retrata os andarilhos
Os loucos e vagabundos
Os malucos da estrada
Que vagueiam pelos mundos
Os desligados do sistema
Com os seus sonhos profundos

Plasma o verso em suas veias
O linguajar cotidiano
A simplicidade da vida
O abstrato em seu plano
Surrealismo aparente
As minudências do humano...

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