quinta-feira, 2 de maio de 2013

PERFIL: SANDRA FAYAD

 
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Por Paccelli José Maracci Zahler

Neste mês de maio, vamos conhecer um pouco da vida e da obra da escritora, poetisa e ambientalista Sandra Fayad.
A entrevista foi concedida por correio eletrônico e, na oportunidade, registramos o nosso agradecimento.

RCC. A senhora nasceu, em 1948, em Catalão, GO. Como foi a sua infância?

SF.Em primeiro lugar, quero apresentar-lhe minha gratidão pela escolha para esta entrevista e pela oportunidade de divulgar minha trajetória e meu trabalho na sua Revista Cerrado Capital.
Respondendo à sua pergunta, nós éramos pobres. Papai trabalhava na roça, mamãe era professora rural. Para que pudéssemos estudar, eles nos enviavam para as casas de parentes na cidade, a 50 km de distância, com o rio São Marcos no meio, que era atravessado de canoa no início e de jipe mais tarde. Ficávamos meses sem ver nossos pais e submetidos às regras dos tios, que agiam com severidade e até com violência para nos “educar”.

RCC. O que despertou o seu desejo de escrever cartas e poemas às escondidas a partir dos 12 anos de idade? Por que às escondidas?

SF.No dia em que eu completei 12 anos de idade, cheguei ao Rio de Janeiro juntamente
com meu irmão de 9 anos,conduzidos pelo papai para sermos cuidados pelas irmãs dele que lá moravam. Isto aconteceu porque havíamos sido despejados da última casa de um irmão da mamãe. Já éramos quatro sobrinhos ocupando a residência deles. Resolveram que ficariam com a minha irmã de 7 anos e um primo.
Nós não conhecíamos nada a mais de 100 km de Catalão e nem essas tias do Rio de Janeiro. Foram dois anos muito duros. Minha válvula de escape e meu consolo eram escrever cartas para a mamãe e poesias às escondidas. Minha tia fiscalizava tudo e, se visse algo nos meus cadernos que não fossem os deveres de escola, rasgava a folha, cortava a sobremesa e ameaçava me devolver para a roça. Lá eu era obrigada a ficar no quartinho de empregada, com acesso apenas ao banheiro de serviço e à cozinha. O restante do apartamento ficava trancado das 6 h da manhã até às 7 horas da noite.
Perto do Natal de 1962 minha tia pegou uma carta que eu havia escrito para a mamãe, onde eu reclamava do tratamento que ela nos dispensava. Imediatamente mandou recado para que o papai fosse nos buscar porque eu era mal agradecida, falsa e traidora.

RCC. Aos 15 anos, a senhora pediu de presente aos seus pais um baile de debutante. O que de fato aconteceu?

SF.Para que não ficássemos sem escola, meus pais se mudaram para a casa velha que havia sido do meu avô, na cidade. Naquela casa faltava quase tudo a começar pelo conforto. A única coisa que não faltava era comida porque o papai era de uma responsabilidade admirável.  Mesmo assim, a alegria inundou a vida da família porque agora estávamos oito novamente juntos. Foi meu primeiro oásis. Fiz novas amigas, reatei as amizades antigas, estudávamos e ríamos muito e de tudo. A situação financeira e social das minhas amigas era bem melhor que a minha. Foi meu primeiro oásis. Ao completarmos 15 anos, realizava-se o baile das debutantes da cidade no CRAC (Clube Recreativo e Atlético Catalano). Todas as mocinhas que completavam 15 anos eram convidadas a participar, mas eu não pude ir porque não havia dinheiro para comprar o tecido. Se houvesse, a mamãe coseria o vestido na sua velha máquina Singer. Fiquei muito triste e pensei que deveria me preocupar com o futuro.

RCC. Parte da sua adolescência foi passada no Rio de Janeiro. Foi lá que a senhora se formou em magistério?

SF. Não. Concluí o curso de professora no Colégio Nossa Senhora Mãe de Deus, juntamente com o Curso de Técnico em Contabilidade na Escola Técnica de Comércio Wagner Estelita Campos (ambos de nível médio), em 1967, na cidade de Catalão.  

RCC. Aos 17 anos, a senhora foi nomeada professora de alunos da zona rural de Catalão, GO. Como foi essa experiência com crianças?

SF.Eu havia iniciado o 2º ano do curso normal, e o Governo do Estado de Goiás estava abrindo oportunidade para as estudantes a partir do 2º ano, de dar aulas a título de pró-labore. Corri lá na Prefeitura e garanti minha vaga. Foi uma época intensa, porque eu estudava pela manhã e à noite e dava aulas à tarde em um bairro distante, conhecido como Boca da Onça. O contato com as crianças, ensinar as primeiras palavras, pegar nas mãozinhas para desenhar as letras foi tudo emocionante.O único inconveniente é que o pagamento mensal chegava com dois ou três meses de atraso.

RCC. Foi lá que começou o seu interesse pelo Cerrado, pela Natureza, tema constante em seus poemas?

SF. A natureza sempre fez parte da minha vida. Desde criança que sou adepta de longas caminhadas pelo simples prazer de observar e me integrar de corpo e alma ao ambiente externo. Nada e nenhum dos seres vivos que estejam nas minhas rotas passam desapercebidos, desde o céu até as depressões. Vivendo dessa forma, não sei se por algum distúrbio psíquico ou por excessiva sensibilidade, eu converso com plantas e animais, naturalmente. Ouço quando reclamam, pedem, agradecem, ficam alegres ou tristes. Então fica muito fácil escrever sobre o Cerrado, onde hoje vivo, e sobre a Natureza em geral.  

RCC. Sua mudança para Brasília, DF, deu-se em 1967. Isto se deu pela aprovação no concurso para a Fundação Educacional do DF?

SF.Não. Quando eu terminei os cursos técnicos em Catalão, não havia perspectivas de trabalho lá. Minha tia Sarah, que morava em Brasília, foi passar o natal conosco. Aproveitei para pedir a ela que me desse uma carona, porque eu queria ver se conseguia algum trabalho aqui. Ela, vendo a situação ruim em que a família se encontrava, atendeu ao meu pedido. Assim que chegamos, fui aceita em uma entrevista para o emprego de auxiliar de escritório em uma construtora, na 504 Sul. Fiquei morando na casa da minha tia, na 107 Sul, por seis meses. Nesse período submeti-me ao concurso público da Fundação Educacional, fui aprovada em 8º lugar e tomei posse no dia 1º de agosto de 1968. Imediatamente, eu trouxe meu irmão (16) para trabalhar na mesma Construtora de onde eu saí e alugamos um quarto em casa de família, na 416 Sul.

RCC. Foi durante a atuação como professora que a senhora decidiu cursar a Faculdade de Economia?

SF.Não. No início de 1969 eu me casei e, por duas vezes, obtive aprovação em vestibulares no CEUB para o curso de Jornalismo. Mas o casamento e a vinda da filha constituíram-se empecilhos para a continuidade dos estudos. Eu apenas dava aulas e cuidava dos afazeres domésticos.
Inquieta e insatisfeita com o pouco que havia conquistado profissionalmente, e ávida por estudar, fiz alguns cursinhos técnicos de curta duração, escrevi muitos poemas que rasguei (ficaram alguns) e submeti-me a mais um concurso público: o de Auxiliar de Controle Externo do Tribunal de Contas da União. Fui aprovada. No começo de 1975, troquei o magistério e o marido pelo TCU e pela Faculdade de Economia na UDF.

RCC. Quando a senhora ingressou no Banco Central?

SF.Em 1978, com o curso de economia já concluído. Foi uma troca difícil, porque eu era a 2ª classificada na lista de promoção a Técnico de Controle Externo do TCU (atual Analista), que de fato ocorreu pouco depois.

RCC. Foi trabalhando lá que a senhora especializou-se em Economia Monetária e Mercado Financeiro?

SF.No BACEN, eu comecei no Departamento de Pessoal. Lá me mantiveram por três anos. Mas minha meta era trabalhar no Departamento de Mercado de Capitais, para onde acabei indo por persistência, sem rancores. Lá encontrei outro oásis. Foram dez anos maravilhosos, onde meu chefe - Iran Siqueira Lima - nos motivava a estudar, nos oferecia desafios sempre, nos mantinha atualizados e unidos.  Éramos uma equipe harmônica e feliz.

RCC. Durante os anos trabalhados no Banco Central a atividade literária ficou em segundo plano?

SF.Nesse período de dez anos, sim. Eu apenas ouvia muita música, lia poesias, romances, best sellers, escrevia muito (pareceres e relatórios técnicos).

RCC. Quando a senhora adquiriu a chácara do Lago Oeste, DF?

SF. Em 1991 eu comprei o terreno já cercado, mas só em 1997 é que construí uma casinha e comecei a plantar. Era a volta mais efetiva para a natureza e a poesia.

RCC. Foi uma maneira de recordar os tempos de Catalão, GO, e ficar ligada à terra?

SF.De certa forma, sim. O papai estava sempre presente e a convivência com ele era rica em aprendizado. Foi também uma compensação. O trabalho burocrático estava me deixando muito tensa. Era a época dos grandes descontroles inflacionários, dos planos econômicos mal sucedidos. Eu me envolvi muito com números, cálculos, relatórios, sucessos e insucessos das medidas governamentais. Necessita de um pouco de paz. Fui buscar na minha velha conhecida, a Natureza.

RCC. Durante o trato com a terra, o contato com os animais silvestres, a inspiração para escrever poemas retornou?

SF.Sim. E dessa vez de forma intensa. Escrevia até três poemas em um só dia. Passei a contar em prosa os comportamentos alterados das pessoas ao meu redor e a estudar melhor as ervas medicinais, os animais silvestres, os cães, as estações do ano.

RCC.  A senhora sempre foi autodidata no cultivo da terra, particularmente de plantas medicinais e condimentos?

SF.Fiz dois cursinhos básicos no SENAR-DF. O resto aprendi através da observação, da pesquisa e de informações obtidas junto à tradição popular.

RCC. Por alguma razão, a chácara teve que ser vendida, após 14 anos de atividade. Este fato a deixou muito sentida?

SF.Não. Preparei a minha saída, assim como fiz das outras vezes na minha trajetória.
Pesei os prós e os contras, tomei a decisão, encontrei uma compradora que estava procurando o que eu tinha para vender, distribuí o que não lhe interessava aos caseiros da vizinhança. Fiz isto inclusive com as matrizes das plantas. Entreguei-as a um caseiro que também conversava com elas e que já as cultivava. Os cães ficaram lá mesmo com a nova proprietária, que os adotou antes de fechar o negócio. Voltei três vezes para visitar as plantas e os cães. Eles estavam mais bem cuidados e mais felizes do que quando estavam comigo.

SF. Foi por essa razão que a senhora decidiu implantar uma horta comunitária em sua casa na Asa Norte?

SF.As plantas haviam passado por um longo processo de adaptação ao clima do cerrado. Aquelas que originalmente eram de clima frio ou úmido demoraram muito para se tornarem “nativas”. Eu pensava que se, por qualquer razão, o rapaz não pudesse mantê-las lá, onde estavam todo aquele trabalho iria se perder. Então procurei um lugarzinho na porta da minha casa para cultivar pelo menos as mais raras.

RCC. A senhora levou para a horta comunitária algumas espécies de plantas medicinais cultivadas na chácara?

SF. O papai, com 91 anos, achou que poderia preparar o terreno na frente da casa para recebê-las, mas o local estava cheio de metais pesados, restos de obra, muita pedra. Assim mesmo resolvemos limpar a área  de 30 m² . Nesse momento o papai faleceu. Foi mais um desafio. Trabalhei muito para recuperar a área durante mais de um ano. Fui lá ao Lago Oeste e trouxe as mudas de cavalinha, alfazema, losna, orégano, sálvia, babosa, poejo, estévia, jambu, e mais 50 espécies.

RCC. Como foi a receptividade dos vizinhos, geralmente acostumados ao asfalto e ao cimento, a uma horta comunitária?

SF. Usei a criatividade. Delimitei o espaço, organizei tudo para caber o máximo de espécies possível, pendurei poesias em garrafas pet, enfeitei, criei um mural, uma caixinha de recados, o grupo ”amigos da horta”. As pessoas e até a imprensa se encantaram com a horta. Muitas não conheciam as plantas como o orégano, a estévia, o jambu. Até hoje eu dou aulas, recebo aulas, troco mudas de plantas, forneço folhagem para chás e recebo gente todos os dias e dos lugares mais surpreendentes. Há vários pedidos de sementes e mudas no meu site para outros Estados. Não sei como atender.

RCC. Apesar de todo o seu esforço, a horta comunitária sofreu uma ação de vandalismo em 2009. Por que razão?
SF. Sim. Dois vizinhos em momentos diferentes causaram destruição na horta, irritados por alguma razão que desconheço. Há duas vizinhas, uma de cada lado, que foram agressivas e não me cumprimentam. Ainda bem que são apenas elas!

RCC. A senhora poderia nos falar sobre a Associação Amigos da Horta?

SF.Trata-se de um grupo que criamos para troca de mensagens por e-mail e por telefone. São mais de duzentas pessoas que visitaram a horta e preencheram uma ficha cadastral voluntariamente.Sempre que há alguma novidade sobre a horta ou outro assunto relacionado ao meio ambiente, eu envio a notícia. Eles comentam, divulgam ou comparecem ao local para tomar uma providência. Foi assim nas duas vezes em que a horta foi danificada.

RCC. Como a senhora mantém a horta quando tem que viajar? Alguém fica responsável por ela?

SF.Sim. Há um jardineiro que me ajuda e a minha família que supervisiona e rega. Antes da viagem, eu faço uma vistoria mais apurada, aplico calda bordalesa, água de fumo se necessário, podo, revejo o sistema de irrigação, limpo bem tudo e não me demoro mais de 15 dias.

RCC. A senhora passou a dedicar-se mais à literatura após a aposentadoria do Banco Central?

SF.Sim. Agora as minhas atividades estão totalmente voltadas para a literatura e a natureza. Os dias são curtos e o tempo passa muito rápido.

RCC. Simone de Beauvoir disse certa vez que “escrever é desvendar o mundo”. O que a senhora pensa a respeito?

SF.É verdade. Dizia também que “não se pode escrever nada com indiferença”. Eu penso que temos que ir fundo nas questões, sem agressividade. Para mim, escrever é atirar-me em um rio, em noite de lua nova. Nunca sei o que vou encontrar lá na frente. Acho que desvendar o mundo é uma via de mão dupla. Sou mensageira na medida da limitação que o tempo  nos impõe. Uso-o intensamente para deixar uma mensagem que beneficie os seres vivos que estão ao meu lado e os virão.

RCC. Qual a sua opinião sobre a atividade literária em Brasília, DF?

SF.Só para efeito de comparação, tenho acompanhado os eventos literários em Goiás. São intensos e dinâmicos. Brasília não foge da sua vocação criativa e de grandes talentos nas várias vertentes da cultura. No entanto, há um entrave sistêmico, onde tudo o que se quer realizar esbarra na vontade institucional, que cada vez  mais interfere para ignorar, desqualificar, desautorizar. A despeito disso, temos tido eventos emocionantes como a Bienal do B no Açougue Cultural T-Bone, os eventos poéticos bem organizados da Casa da Cultura do Guará, da Casa do Cantador, da Tribo das Artes, do Projeto Eulirico, do Hezio Teixeira e não poderia deixar de citar a sua iniciativa com a Revista Cerrado Cultural. Isto mostra que o investimento da Secretaria de Cultura na literatura no Distrito Federal é praticamente nulo.

RCC. Quais seus projetos literários para este ano de 2013?

SF.Vou aventurar-me no primeiro romance. Desta vez busco inspiração nas anotações antigas e na experiência da convivência com meus semelhantes físicos. Por ora, lanço no próximo dia 03 de maio (sexta-feira) o livro “Histórias de Jorge, O Batuta” e mais dois livros de poesia: “Poemas Síntipos” e “Cerrado Capital - A vida em duas estações”, evento para o qual convido você e todos os seus leitores. Espero-os na Livraria Cultura do Shopping Iguatemi, a partir das 20 h.

AHORRANDO BRILLAMOS!


Por Chantal Cardoso Herrera (La Habana, Cuba)

Todos dicen que lo último que existe, es cuando el mar se une con el cielo. Pero nadie sabe que más allá, tras nubes esponjosas, viento fuerte y magia, existe una isla más pequeña que el dedo meñique.

Esta isla que se creó en el hielo, con las últimas maravillas que quedaban en el mundo, pero está habitada por personitas que no son tan maravillosas.

Ahora, te invitó lector, a que conozcas lo que sucedió un día, en ese pedazo de cielo.

Todos allí, tienen un gran corazón, son personas que perdonan, comprenden, y sobre todo, aman. Pero tienen un defecto, no saben que significa ahorrar, pues encienden cada luz a toda hora del día, creyendo, que así, son más especiales.

En la isla se encuentra un resplandeciente árbol de Navidad, que es el encargado de que en cada rincón exista armonía y felicidad, es el que hace, que en cada persona brillen sentimientos nobles y hermosos.
La situación empeoraba cada vez más, y la negligencia de los habitantes, empezaba a marchitar el árbol, que le daba vida al bello lugar.

Un día, amaneció con una gran masa de calor que cubría la isla, y empezaba a sembrar el caos por doquier.

El poblado no estaba acostumbrado al excesivo calor y el mágico árbol comenzó a desprender sus hojas, comenzó a llorar lágrimas negras que acababan con la felicidad de los rincones. Después todo quedó en el más puro silencio.

Ese día habían comprendido la importancia de ahorrar electricidad, pues el gasto incesable de ésta, trajo como consecuencia el cambio climático, que es otro problema que debemos combatir todos.


Después, cogieron en sus suaves manos, unas semillas de amor y las sembraron…..para que creciera un gran árbol, que brillara, con la promesa de ahorrar, por un mundo mejor.

AO POETA

Por Pedro Du Bois (Itapema, SC)

 
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JORNADA

Por Pedro Du Bois (Itapema, SC)


 
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MARUJO

Por Pedro Du Bois (Itapema, SC)


 
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VIDAS

Por Pedro Du Bois (Itapema, SC)

 
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O ESTILO DE JOÃO SIMÕES LOPES NETO NOS “CONTOS GAUCHESCOS”

Por Eneida Moraes Miranda Zahler

INTRODUÇÃO

            João Simões de Lopes Neto está classificado como escritor regionalista do Rio Grande do Sul. Para narrar os Contos Gauchescos, com um acento popular autêntico e espontâneo, o autor criou o personagem Blau Nunes, vaqueano caboclo, que cruzou toda a Província no tempo em que as estâncias não tinham divisas bem definidas.
            Augusto Meyer, prefaciando a edição de 1961 dos Contos Gauchescos e Lendas do Sul, afirma que talvez “ninguém no Brasil tenha conseguido uma identificação tão profunda com o espírito dos seus conterrâneos, a tal ponto que o próprio Simões Lopes Neto, o pelotense culto e de família tradicional, inteiramente se apaga na sombra de Blau, o vaqueano”.
Essa postura não é comum entre os escritores regionalistas que geralmente portam-se ante o homem do povo como espectadores finos que se divertem com o linguajar caipira.
Simões Lopes Neto consegue uma continuidade entre o linguajar e a estilização, jogando com os recursos do estilo indireto e, raras vezes, o leitor se dá conta do momento em que a prosa rude de Blau Nunes deixa transparecer a voz do autor. Um exemplo desses raros momentos pode ser encontrado na descrição do crepúsculo em Trezentas Onças, onde parece que o personagem cedeu a palavra ao autor:

“A estrada estendia-se deserta; à esquerda os campos desdobravam-se a perder de vista, serenos, verdes, clareados pela luz macia do sol morrente, manchados de pontas de gado que iam se arrolhando nos paradouros da noite...”

Embora se enquadrem na literatura regionalista, os Contos Gauchescos acham-se marcados de verdade humana, ultrapassando o círculo do interesse local. Em toda a obra o aspecto psicológico se impõe e a paisagem, as singularidades do ambiente e a forma dialetal se unem para dar um colorido especial à expressão das dores e alegrias humanas.


O ESTILO

Entende-se por estilo, nas palavras de Othon M. Garcia (1983), “tudo aquilo que individualiza uma obra, como resultado de um esforço mental, de uma elaboração do espírito, traduzindo idéias e imagens. A rigor, a Natureza não tem estilo; mas tem-no o quadro em que o pintor a retrata ou a página em que o escritor a descreve”.
Na literatura do tempo de Simões Lopes Neto, a paisagem era uma peça sobreposta ao conto ou ao romance, não fazendo com eles um todo. Retirada da história, esta funcionava perfeitamente.Fazia-se a paisagem pela paisagem.
Na obra de Simões Lopes Neto, a paisagem é assimilada, não impressiona em detalhes mas no conjunto. O contista gaúcho sabia fundir as notas descritivas do ambiente no próprio corpo da narração, em períodos onde vai se desenrolando a ação do conto.
Blau Nunes não se detém a derramar frases sobre um rio ou uma estância. Contadas por um campeiro como são as histórias de Simões Lopes Neto, seria nelas impertinente o exagero de paisagem. Sobretudo no caso do personagem que fala para a gente do seu meio.
Diz Aurélio Buarque de Hollanda (1961) que “ a frugalidade paisagística é, pois, uma das manifestações mais finas da arte de Simões Lopes Neto”. Por exemplo, o seguinte trecho do conto Trezentas Onças:
“- Olhe, ali, na restinga, à sombra daquela mesma reboleira de mato, que está nos vendo, na beira do passo, desencilhei.”


ELEMENTOS DO ESTILO


a)      O PITORESCO

As comparações contidas na obra de Simões Lopes Neto são bastante originais:
“uma carta grande, fechada com mais obreias do que tragas de vinho tem um copo de missa, de padre gordo.”  (MelanciaCoco Verde)
“olhava pra gente, como o sol olha pra água: atravessando!” (Duelo de Farrapos)
Esse pitoresco, porém não está só nas comparações mas no uso de certos modismos populares:
“enquanto a galinha lambe a orelha!”  (O Mate do João Cardoso)
“A estrangeirada foi quem ensinou a gente de cá mergulhar e ficar de cabeça enxuta...” (Contrabandista)


b)      A CONCORDÂNCIA

Silepse


            Algumas vezes o autor emprega a silepse de número:
            “E que torunas! Cada bicho pesado, criado na pura grama vermelha, ligeiros como gatos...” (Juca Guerra)
            “Muita gente anda no mundo sem saber pra quê: vivem , porque vêem os outros viverem.” (Artigos de Fé do Gaúcho)

c)      A REGÊNCIA

A regência empregada pelo contista, não raro, é inteiramente pessoal, apoiada na analogia, sendo que alguns verbos aparecem com regimes que não figuram nos dicionários:

“E tais cuidados deu-lhe que a planta pegou, botando raízes firmes e espigando ramos e folhas.” (Manantial)
Nos dicionários, o verbo espigar aparece apenas como intransitivo, como também o verbo entreparar no exemplo seguinte:
            “... e até o coveiro se entreparou atristado...” (Penar de Velhos)

d)     A ELIPSE

Nos Contos Gauchescos, as elipses são constantes, podendo ser puramente literárias, ou colhidas na língua viva do povo.
Na apresentação do herói Blau:
“...benquisto tapejara Blau Nunes, desempenado do arcabouço de oitenta e tantos anos, todos os dentes, vista aguda e ouvido fino...”
Em Correr Eguada:
“... então o gaúcho desenredava as boleadeiras e assinalava e mal isto , já o bagual se aprumava...”
A omissão do fazia depois de mal aviva o sentido de rapidez na transição entre as ações do gaúcho e a do bagual.

e)      O PLEONASMO


Os pleonasmos são abundantes nas páginas de Simões Lopes Neto, alguns de sabor popular, outros resultantes de influência literária.
No conto Boi Velho, encontra-se:
“...tal e qual como uma pessoa penarosa...”

Em Penar de Velhos:
“ ...as mulheres desataram num pranto de choro...”

f)       POLISSÍNDETO

Essa figura de linguagem, bem usada, dá vida e cadência ao discurso:

“...ele era um perdidaço pela cachaça e pelo truco e pela taba...” (Negro Bonifácio)

“E ajoelhou...e caiu...e morreu...” (Boi Velho)

“...tudo aquilo treme e bufa e borbulha...” (Manantial)


g)      A REPETIÇÃO


Elemento que não só dá ênfase, como também cadência:
“Pois o velho olhou...olhou...e ficou calado. E calado saiu.” (Chasque do Imperador)
“...era eu que encilhava-lhe o cavalo, que dormia atravessado na porta dele, que carregava os papéis dele e as armas dele.” (Chasque do Imperador)
“E rindo e chorando estava, sem saber porquê...sem saber porquê, rindo e chorando, quando alguém gritou...” (Contrabandista)

h)      AS RETICÊNCIAS


Simões Lopes Neto abusa das reticências, e elas vêm muitas vezes acompanhadas de exclamação.
Para Aurélio Buarque de Hollanda (1961), “tais sinais, sendo, como são, psicológicos, não se impondo como necessidade de respiração, podem muitas vezes ser dispensadas, com vantagem para o estilo.”
Há, porém, momentos em que o resultado alcançado com o grande uso das reticências é positivo, com por exemplo:
“- Há que tempos eu não chorava!...Pois me vieram lágrimas..., devagarinho, como gateando, subiam... tremiam sobre as pestanas, luziam um tempinho... e ainda quentes, no arranco do galope lá caíam elas na polvadeira da estrada, como um pingo d’água perdido, que nem mosca nem formiga daria com ele!...” (Trezentas Onças)

i)        AS QUALIDADES ESTILÍSTICAS MAIS PESSOAIS


Para exemplificar as marcas nitidamente pessoais e os traços mais vivos do escritor, vale citar a descrição da paisagem das Trezentas Onças:
“Nos atoleiros, secos, nem um quero-quero: uma que outra perdiz, sorrateira, piava de manso por entre os pastos maduros; e longe, entre o resto da luz que fugia de um lado e a noite que vinha, peneirada, do outro, alvejava a brancura de um joão-grande, voando, sereno, quase sem mover as asas como uma despedida triste, em que a gente não sacode os braços...
Foi caindo uma aragem fresca; e um silêncio grande, em tudo.”
Na opinião de Aurélio Buarque de Hollanda (1961), essa “é uma das mais belas descrições de paisagem da língua portuguesa”; e Simões Lopes Neto consegue escapar do banal e do rebuscado na descrição de um crepúsculo, coisa bastante batida na literatura.
Nessa descrição, nota-se uma precisão sensível na colocação das palavras, ao mesmo tempo em que o ritmo um tanto arrastado se harmoniza com a lentidão do entardecer.



j)        O LIRISMO

Simões Lopes Neto é, sem dúvida, um poeta. Sua sensibilidade é apurada, sendo capaz de ter empatia não apenas com o ser humano, mas também com os animais, os vegetais e até mesmo com os seres inanimados:
“O boi velho sentindo-se ferido, doendo o talho, quem sabe se entendeu que aquilo seria um castigo, algum pregaço de picana, mal dado, por não estar ainda arrumado...- pois vancê creia!-: soprando o sangue em borbotões, já meio roncando na respiração, meio cambaleando, o boi velho deu uns passos mais, encostou o corpo ao comprido do carretão e meteu a cabeça, certinho, no lugar da canga, entre os dois canzis...e ficou arrumado, esperando que o peão fechasse a brocha e lhe passasse a regeira na orelha branca...
E ajoelhou...e caiu...e morreu.” (Boi Velho)
E no Manantial:
“O arranchamento alegre e farto foi desaparecendo...o feitio da mão da gente foi-se gastando, tudo foi minguando; as carquejas e as embiras invadiram; o gravatá lastrou: só o umbu foi guapeando, mas abichornado como viúvo que se deu bem em casado...; foi ficando tapera...a tapera que é sempre um lugar tristonho onde parece que a gente vê gente que nunca viu...”



BIBLIOGRAFIA CONSULTADA


GARCIA, O.M. Comunicação em prosa moderna, 11ª edição, Rio de Janeiro, Fundação 
     Getúlio Vargas, 1983.

HOLLANDA, A.B. de. Introdução crítica. In: SIMÕES LOPES NETO, J. Contos
     gauchescos e lendas do Sul, 2ª edição, Porto Alegre, Globo, 1961, pp. 71-104.

MEYER, A.Prefácio e notas. In: SIMÕES LOPES NETO, J. Contos gauchescos e lendas
    do Sul, 2ª edição, Porto Alegre, Globo, 1961, pp. 11-23.

SIMÕES LOPES NETO, J. Contos gauchescos e lendas do Sul, 2ª edição, Porto Alegre,
   Globo, 1961.


APÊNDICE


GLOSSÁRIO

AJOUJAR – prender com ajoujo (corda ou corrente que unem bois ou cães de caça)
ALVOROTO – alvoroço
ASPAS – chifres
BROCHA – correia que sob o pescoço do boi se prende aos canzis
CABRESTEAR -  obedecer facilmente à tração do laço
CANZIL – marca na orelha do gado
CARACA – ruga que surge na base dos chifres dos vacuns
CHAIRAR – afiar
CUSCO – cachorro vira-lata
GOLPEADO – impulsivo
JACUBA – mingau ralo feito com leite, farinha de mandioca e açúcar ou mel
MATUNGO – cavalo velho ou muito manso
MINUANO – vento muito frio e seco que sopra do sudoeste em meses de inverno e eventualmente no outono e primavera
MIUÇALHA – criançada
MUCHACHO – pedaço de pau em que se descansa o cabeçalho da carreta
MUNHATA – batata-doce
PERAU – diferença repentina para maior, no fundo do mar ou rio ou outros cursos d’água
PICANA – vara que tem na ponta um ferrão para picar os bois na carretagem
PREGAÇO – ferimento com instrumento perfurante
REGALO – presente (do espanhol)
REGEIRA – corda de couro torcido, que presa à cabeça dos bois com uma volta passada pela orelha, do lado externo, serve para dirigi-los
RINCÃO – trecho de campo
SANGA – pequeno arroio
SARANDI – arbusto comum no Rio Grande do Sul
SARANDIZAL – extensão de terreno ocupada por sarandis

SOLITO – sozinho ( do espanhol)