quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

PERFIL: LUIZ DE MIRANDA

 


Por Paccelli José Maracci Zahler

Para e edição de fevereiro de 2012 da Revista Cerrado Cultural, tivemos a honra de entrevistar, por correio eletrônico, o poeta Luiz de Miranda, gaúcho, natural de Uruguaiana, RS.
O poeta Luiz de Miranda, em 20 de março de 2011, recebeu a Medalha de Ouro do Senado Francês, no Salão do Livro de Paris, onde autografou seu livro “Trilogie du Bleu”, publicado na França. Além desse galardão, recebeu também o Prêmio da Academia de Artes, Ciência e Letras daquele país. Em sua turnê pela Europa, atendendo a convite do Departamento de Filologia Moderna Latina, da Universidade das Ilhas Baleares, Palma de Mallorca, Espanha, fez palestra e recital no dia 24 de março de 2011. Em 2008, ele havia recebido o Prêmio Luso-Espanhol de Lisboa, com o apoio do Instituto Camões, de Portugal.
Todos os seus feitos têm sido registrados pelos meios de comunicação e, a respeito dele, Juremir Machado da Silva, na coluna Opinião do Jornal CORREIO DO POVO, de Porto Alegre, RS, edição de 9 de outubro de 2011, escreveu:

Até parece aquele dita: santo de casa não faz milagre.
Miranda brilha lá fora.
Até a revista Caras deu-lhe espaço.
Miranda é o grande poeta gaúcho em atividade.
Ninguém fala do pampa como ele.
Bota a gauchada no bolso.
Orgulho do Rio Grande!
E sempre maldito.
O único que na ficha do hotel põe: poeta.”


Registramos o nosso agradecimento ao poeta Luiz de Miranda pela gentileza em ceder parte do seu precioso tempo para responder às nossas perguntas, as quais, certamente, permitirão aos nossos diletos leitores conhecer um pouco do seu PERFIL.

RCC. O que significou crescer na fronteira do Uruguai e da Argentina?

LM. Vivi 21 anos na rua Aquidaban, à beira do rio Uruguai, fronteira com a Argentina. Com 17 anos comprei livros do espanhol Vicente Aleixandre e de Pablo Neruda, que depois seriam Nobel. Essa vivência tornou o espanhol a minha segunda alma. Era de uma casa de analfabetos, mãe, vó e padrasto. Um dia, conversando com José Saramago, ele me disse que tínhamos algo em comum, seus pais também eram analfabetos.

RCC.Foi esse contato com a cultura de uma tríplice fronteira que despertou sua vocação literária?

LM. Sessenta por cento foi.

RCC.Qual foi o papel da Professora Domingas Faraco em sua formação literária?

LM. Ela me ensinou o amor à Poesia. Com ela conheci a vida dos românticos. E descobri Cruz e Souza, o maior poeta do século XIX.

RCC.O senhor sempre escreveu poemas ou teve incursões pela prosa?

LM. Sempre só escrevi Poesia.

RCC. Entre 1963 e 1966, o senhor colaborou com o jornal A Platéia, de Santana do Livramento, RS. Sobre o que escrevia?

LM. Foi onde publiquei meus primeiros poemas e algumas crônicas de teor crítico sobre artes plásticas.

RCC. Em determinado momento de sua vida, mais precisamente em 1966, o senhor ingressou no curso de Zootecnia, ainda em Uruguaiana. O que o motivou a interrompê-lo e a ingressar no curso de Teologia em São Paulo?

LM. Eu sempre quis sair de casa e correr mundo e correr perigo. Em 1966, fiz um Curso de Guerrilha na China, depois fui estudar em São Paulo, a capital cultural do país, à época.

RCC. Havia alguma angústia existencial específica?

LM. Não havia angústia existencial, mas um sentido profundo de mudar o país. Estreei nessa época na luta armada com Carlos Marighella.

RCC. Em 1968, como opositor ao governo militar, o senhor sofreu perseguições políticas. Como foi esse período?

LM. Foi o ano mais importante da minha vida. Estreei minha peça em 1 de maio de 1968 em São Paulo: "Povo, Palavra, Amor ,Liberdade", que foi censurada e retirada de cartaz. Cai na clandestinidade e voltei para o sul, Cidade de Alegrete. Com a AI5, foi decretada minha prisão. Dia 14 de dezembro de 1968, fugi para as matas densas do rio Ibicuí, onde dormi 18 dias no chão, sem saber o que acontecia do país. Dia 1 de janeiro me exili no Uruguai.

RCC. O senhor chegou a ser preso e torturado? Ou a fazer parte de alguma organização de esquerda?

LM. [Diz o]Verbete retirado do livro "Dicionário ilustrado da Esquerda Gaúcha", de João Batista Marçal, 2008: "Miranda, Luiz de. Um dos maiores poetas brasileiros de todos os tempos, jornalista e intelectual. Militante socialista. Natural de Uruguaiana,cidade em que nasceu a 6 de abril de 1945. Fez curso de guerrilha na China, para onde foi encaminhado por Ulisses Vilar, em 1966. Atuando na luta armada que se contrapunha ao Golpe de 1964, foi preso em Uruguaiana, em 1969, e no Teatro de Arena, em Porto Alegre, em 1971, sendo o único ator gaúcho preso. Mesmo caçado pela polícia dos militares, participou em São Paulo de ações do POC,, da ALN, da VPRe do MTR. Em Porto Alegre, no MCR, coordenou a estratégia da última expropriação bancária, em dezembro de 1970.Segundo o poeta e crítico Gerar Melo Mourão "Luiz de Miranda é o poeta medular do Rio Grande."(Rio, 1969). Tem 27 livros publicados."

RCC. A fronteira do RS com o Uruguai e a Argentina era considerada Área de Segurança Nacional. Como foi estar lá em pleno regime militar?

LM. Perseguido o tempo todo.

RCC. Em 1969, o senhor começou a cursar Filosofia na PUCRS, ao mesmo tempo em que trabalhava como ator no Teatro de Arena e redator na Rádio Gaúcha. Entretanto, o curso foi abandonado em 1972. Por que razão?

LM. Trabalhei em vários jornais brasileiro e agências de propaganda. Fui expurgado dos Cursos de Teologia e Filosofia.

RCC. No seu íntimo, havia aquela inquietude natural de todo o jovem que busca um caminho diferente daquele seguido pelos pais?

LM. - Eu sempre fui um poeta revolucionário na forma e na prática.

RCC. A partir de 1970, sob o governo Médici, o senhor enveredou pela área artística. Como foi essa trajetória?

LM. Não aconteceu isto.

RCC. A grande maioria dos escritores se queixa da impossibilidade de viver de literatura. A literatura sempre foi seu ganha-pão ou o senhor exercia uma outra atividade profissional?

LM. Eu vivo da minha poesia desde 1994. Antes fui Secretário de Cultura e Assessor do Governador Alceu Collares, Quando foi prefeito de Porto Alegre, fui Diretor de Cultura e idealizei a criação da Secretaria de Cultura da capital, em 1986.

RCC. Qual o significado da fundação da Associação Gaúcha de Escritores da qual o senhor foi eleito o primeiro presidente?

LM. Fui o idealizador e o primeiro presidente da Associação, que teve a seguinte diretoria: Luiz de Miranda, presidente- Tarso Genro, vice- Dilan Camargo, secretário- Donald Schuller, segundo secretário- Antonio Hohlfeldt, tesoureiro- Lya Luft, vice.

RCC. Que projetos foram implementados na sua gestão?

LM. Lutamos contra a censura e colocamos escritores na provas de vestibular, e participávamos diretamente do debate político-cultural.

RCC. Qual a sua opinião sobre a regulamentação da profissão de escritor?

LM. Já era para existir há muito tempo.

RCC. Sua obra é vasta, com mais de 3.500 páginas impressas, superando Pablo Neruda e Ezra Pound. De onde vem essa verve?

LM. Desde de 1995, escrevo todo o dia e tenho publicado livros grandes. Em 2005, publiquei o maior, :"Nunca Mais Seremos os Mesmos", um longo poema de 416 páginas.

RCC. Como é o seu processo de criação literária? Ela depende de inspiração ou é um hábito diário?

LM. Eu trabalho um livro com temático, e todos os dia escrevo vários poemas.

RCC. O senhor é, sem sombra de dúvidas, um dos maiores poetas brasileiros, quiçá o maior. Aclamado pela crítica, imortal, premiado e reconhecido internacionalmente. Refletindo sobre a sua trajetória, o que a vida lhe ensinou?

LM. Eu amo meu trabalho e me dedico a ele de de corpo e ama. E a vida é o grande painel da literatura. E eu tenho vivido minha vida intensamente. Sou solteiro, não tenho filhos. A Poesia é a minha grande companheira nesta trajetória que Deus me deu.
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Um comentário:

  1. O Poeta Luiz de Miranda é espelho e reflexo da nossa literatura. Figura maior. Grato por trazer suas palavras a todos nós. Abraços, Pedro.

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